sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Doctor Who 10x00: "The Return of Doctor Mysterio" - With great power comes great responsability...



Se existe um episódio que eu imaginei, num primeiro momento, que me levaria à extremos de opinião, era este, o especial de natal "The Return of Doctor Mysterio". Por um lado, a proposta era brincar com alguns tropes dos quadrinhos e vcs já devem estar cientes que HQs são minha forma de arte preferida, mais que musica, literatura, cinema, games, etc, etc, etc. Por outro, leitores de longa data deste blog sabem o que eu penso de filmes de super heróis, seriados de super heróis e coisas do tipo. 
Se não souberem, uma dica: eu odeio filmes marvel e dc e acho que seriados de superheróis são comédias involuntárias. Simples assim. 
Sob um TERCEIRO lado (pq afinal, quadridimensionalidade é o que liga) Steven Moffat é um escritor particularmente esperto e a possibilidade dele inserir alguns insights particularmente sagazes com o olhar britânico pra esse produto tão norte-americano quanto Elvis e a torta de maçã prometia horrores.
E o que temos como produto final?

Bom....um especial com um bando de personagens meh, mas com uma trama geral particularmente esperta. Da primeira vez que vi o especial, achei BEM fraco. Revendo agora, no entanto, tendo visto a season 10 inteira, dá pra dizer que o longa é um grande preludio de tudo que a temporada traria.


The Doctor: Things end. That's all. Everything ends. And it's always sad. But everything begins again too, and that's always happy. Be happy. I'll look after everything else.




Okay, admito que o fanboy em mim teve ataques de fangirl com o prédio com o globo girando em cima, com a menção à ms. Siegel e ms. Shuster, quando percebeu a referencia do nome Lucy Lombardo e quando ouviu o 12th evocando a frase clássica que Tio Ben ensinou ao Peter. Mas como eu disse acima, não posso dizer que Grant e a jornalista são dois personagens que vão deixar marcas na minha memória, o mesmo podendo ser dito deste especial como um todo. Como eu nunca fui fã do Superman do Richard Donner, não posso dizer que a dinâmica entre o Ghost e a jornalista, culminando na óbvia referencia na cena da entrevista dos dois, mexeu comigo. 
Num geral, fiquei com a impressão de que o mais interessante do episódio, ou o que poderia ter sido o mais interessante nesse especial, se Moffat tivesse interessado em se aprofundar em tais questões, seria mostrar as diferenças entre a visão americana e a britânica dos super heróis. Tem algo de sociológico a ser explorado nesse tema. Sempre fui fascinado em pegar as nuances que separam os super humanos norte-americanos e suas contrapartes japonesas, por exemplo. Num geral, heróis americanos ganham seus super poderes, quase como uma dádiva cósmica, personificações milagrosas do destino manifesto. Acidentes científicos e coincidências cósmicas que deveriam matar indivíduos mas que, ao contrário, concedem poderes. Visitantes alienígena que, como presente de boas vindas, ganham habilidades ultra humanas. E claro, mutantes. Gente que simplesmente nasceu com habilidades semidivinas.
Já do lado japonês, mesmo se vc tiver nascido como o "the chosen one", tenha talento absurdo ou algo assim, nada vem de graça, tudo é obtido via muito, mas MUITO treino, suor derramado e trabalho duro. Se a personificação do herói americano é o Superman, o exemplar perfeito do super justiceiro nipônico não seriam Goku ou Naruto, mas sim Kuririn e Rock Lee, indivíduos que, sem grandes poderes vindos de berço, tiveram que ralar feito dois filhos da puta pra conseguir se manter ombro a ombro com os colegas.

"ah, mas o Batman..."

O Batman tem o maior superpoder que qualquer pessoa pode ter na sociedade ocidental: dinheiro. Vai fazer viagem ao redor do mundo treinando e construir batmóveiS - no plural - recebendo 3 salários mínimos e aí a gente volta a conversar.... 

Enfim, o especial decide não tomar o caminho da ironia e prefere se tornar uma declaração de amor aos tropes de quadrinhos e por mais que eu consiga entender o pq disso, ainda acho uma oportunidade perdida. Entendo que, talvez, os especiais de natal não seja o lugar pra esse tipo de crítica, preferindo um tom mais leve e de coração aberto que um ep. normal de meio de temporada, mas ainda assim. 


Não gosto particularmente da raça de alienígenas que serve de vilões pra essa trama, piada de uma nota só, mas por outro lado, interessante ver que todo o plano gira em torno de dominação mundial via "hostile takeover" sob um viés típico de administração de empresas. Indo além, temos um grupo distinto tramando uma alternância de poder através de um falso inimigo, da cultura do medo e da exploração de uma elite financeira e política particularmente estúpida. Como se não bastassem os Daleks e os Cybermen, o Doutor decide tomar como inimigo uma praga bastante familiar, tanto pra ele quanto pra gente: o capitalismo. Ainda que se ressalte que não é a primeira vez que corporações de qualquer natureza e suas metas de lucro entrem em choque com os valores do timelord. Algumas das histórias mais famosas do 6th e do 7th Doctor giram em torno de grupos tentando lucrar financeiramente com a tragédia e o extermínio de raças inteiras e de vez em sempre, todas as versões do personagem já lidaram com CEOs e Warmongers mal intencionados (com o perdão do pleonasmo #eattherich). 
Dos grandes macro temas dos preferidos de Moffat, temos de volta o poder das histórias. Grant consegue seus poderes literalmente ao "desejar pra uma estrela cadente", ainda que de forma pouco ortodoxa. 
"The Return of Doctor Mysterio" é um monte de coisas e poderia ter sido outro monte delas. Injusto julgar uma obra pela que ela escolhe NÃO ser, então, vou dizer apenas que é um especial divertido, irregular, longe de ser o melhor dentre os roteiros de Moffat, mas um bom sinal do que viria - de forma melhor e mais densa, devo dizer - no decorrer do décimo ano de DW. 

Mais alguns perdigotos de idéia
- Nardole começa a se distanciar do papel de alivio cómico e se aproxima daquele que ele vai desempenhar massivamente durante a season 10: basicamente a consciência do Timelord, o grilo falante tentando manter o Doutor nos trilhos. 
- Incrível como natal é um período melancólico sob a perspectiva de Moffat - não que eu discorde, aliás. Quase todo especial de Natal dele lida com o Doctor ou algum outro personagem lidando com perdas ocorridas no ano anterior. Os Ponds, Clara, River. Time of the Doctor sendo o pináculo disso, onde o protagonista se via confrontado com a própria finitude.....
- Mais uma vez: que maneiro ver o Doutor dizendo que grandes poderes trazem grandes responsabilidades. 
- "Isso parece barato". Ninguém jamais dirá que DW não é uma série consciente de suas limitações.... :-) 
- Se formos tomar como base o gibi do Superman que Grant estava lendo e a arte do Hulk no poster na parede em seu quarto, o guri é um grande fã de John Byrne. Entendam isso como quiserem. 


The Doctor: Superman and Clark Kent are one and the same person. 

Young Grant: Are you serious? 
The Doctor: Yeah. Look, I drew specs on Superman. 
Young Grant: Everyone knows they're the same person. 
The Doctor: Well, Lois Lane doesn't. And she's a reporter.


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