sexta-feira, 23 de agosto de 2019

"Risco é parte do jogo": "Gunning for hits" e "Ballers" S01

“If you are playing the game without wounds, you are not playing the game, you are watching the game. If you are playing the game with wounds, you are not playing the game, you are mastering the game”

Yo...eu tenho tanto amor quanto qualquer pessoa dotada de algum bom senso por frases motivacionais. Ou seja, muito pouco. But again yo: Se vcs lerem a frase acima com o devido cuidado, vão perceber que o autor fala de JOGAR o jogo e se aperfeiçoar. Mas nada garante que vc vá GANHAR o jogo apenas pq vc joga bem. 
Also: manjam aquela frase sobre salsichas e política? Eu botaria arte nesse bolo também. E é sobre isso que as duas paradas maneiras que eu vi e li recentemente giram em torno. Livros, jogos, gibis, séries, essas paradas que falam sobre coisas geralmente focam nos heavy gamers. Obras sobre artistas focam, obviamente, nos artistas, nos músicos, nos pintores, nos escritores. Obras sobre esportistas? Nos jogadores e, quando muito, nos técnicos.
Mas quem conhece um pouquinho as paradas, sabe que esses "jogos" tem dois lados. O legal, que recebe os holofotes e os bastidores, o lado atrás das cortinas. E é disso que ambas as obras das quais falo nesse post vão se focar. Onde as fucking salsichas são feitas.


Tomemos "Gunning for hits", por exemplo e a indústria da música. Temos o artista, compositor e o resto de sua banda. Uma vez que eles conseguem um contrato - escrito por um advogado - eles estão financeiramente ligados à uma gravadora. Gravadora essa que tem um diretor e vários setores, de marketing até a parte de produção musical em si, passando pelo já citado setor legal, a parte de logística dos shows, etc., etc., etc. A história começa em 1987 onde, até o pescoço nessa cadeia produtiva, Martin Mills é um caçador de talentos, o cara que fazia o meio de campo entre os artistas e a gravadora. No começo da trama, ele está tentando fechar um contrato com a banda Stunted Growth, liderada por Billy e, alguns diriam, Diane, sua namorada e manager. Paralelo a isso, o lendário Brian Slade, estrela dos anos 70, mas que parece ter atingido certa falência criativa, está em busca de um novo contrato com alguma major. Quando todos esses personagens se juntam, o resultado é caos, puro e simples.
Also, Mills pode ter certas sombras no passado que vão ter que ser resgatadas no meio desse clusterfuck. Fim do resuminho, podemos ir pra parte que interessa: Que gibi foda. QUE GIBI FODA.
Dois motivos simples: roteiro e arte. :-)
Obviedades à parte: O texto da minissérie é de Jeff Rougvie e aqui eu faço uma pausa. O cara pode ser um quadrinista sem muitos títulos no catálogo, mas seu expertise no assunto desse gibi, música e os meandros da indústria musical, vem dos anos e anos dedicados à ela. Entre os diversos papéis que exerceu nessa área - incluindo produção e talent manager, tal qual o protagonista da hq -, ele tem uma passagem pela Rykodisc's onde atuou na obtenção de direitos de material clássico para posterior remasterização pro lançamento em cds. Nisso, ele lidou com o acervo de bandas como Meat Puppets, Devo, Dead Can Dance, Elvis Costello, Bootsy Collins, Mission of Burma, os cds de comédia de Bill Hicks e...... 16 dos discos clássicos de não outro senão DEUS em pessoa. O que me leva, obviamente a aquilo que me fez prestar atenção nesse gibi, num primeiro momento, antes de saber de tudo isso sobre arte, texto e os cacetes...


Familiar? Pois é. Brian Slade é DEUS em pessoa. E isso nem é disfarçado, não apenas pq Moritat, o artista responsável pelos desenhos de Gunning for Hits concebeu o personagem com as feições de vcs-sabem-quem, mas pq o nome, Brian Slade foi inspirado do clássico Velvet Goldmine, filme de 1998 de Todd Haynes que narra as aventuras de um jornalista musical na caça de um artista  britânico desaparecido a anos que tem esse nome.
Foto do rapaz


Familiar? Esse filme tb tem o Ewan Mcgregor atuando como Iggy Pop Curt Wilde, parceiro de Slade e que.....como direi..... fazia um monte de coisa com o cara. Incluindo arte. 
So.... anyways, falei do roteiro, voltemos ao traço de Moritat: a arte do cara é tão bonita mas, além disso, TÃO refrescante. Tipo, uma versão mais fanzinão punk do traço Tex Avery de Kyle Baker, as expressões oscilam entre o minimalista e, quando a trama pede, o larger than life. E os rostos são tão distintos uns dos outros, um treco tão raro em gibis serializados. 
Considerando seu passado, não é surpresa nenhuma que Rougvie desfila toneladas de detalhes sobre as engrenagens da indústria fonográfica americana e como as grandes majors funcionam e, de novo, tudo é novo e único e tem aquela capa ultra-pop que vc em obras tipo Wicked + Divine e Sandman, sabe? Esse é um gibi que eu consigo fácil ver fugindo do gueto do fã de quadrinhos e atingindo aquele pessoal cool que vai pra balada na Augusta e lê Vertigo de tempos em tempos. O roteiro abraça os "horrores" da indústria num nível literal, equilibrando a trama sobre música com os elementos sórdidos do passado de Mills. A conclusão é incrível, onde os dois elementos que constroem essa história (crônica sobre a indústria musical + thriller) colidem de forma perfeitamente harmoniosa. Fiquei animadaço com o anúncio do final da sexta e ultima edição, prometendo uma nova série nesse mesmo universo, mas mudando o gênero. As guitarras e baterias dão lugar aos mics, deejays, ritmo e poesia e mano, considerando que eu tenho, talvez, ouvido mais rap do que rock ultimamente, já fico no aguardo ansioso pela sequência. 



"'Cause the players gonna play, play, play, play, play
And the haters gonna hate, hate, hate, hate, hate"
Taylor Swift, "Shake it off"

Ainda sobre os bastidores de uma indústria de entretenimento gigante, saímos da música e vamos para o esporte: Devorei essa semana os 10 episódios da primeira temporada de "Ballers", série da HBO protagonizada por Rock "The Dwayne" Johnson e Rob Corddry como gerentes financeiros de grandes atletas do futebol americano. The Rock aqui é Spencer Strasmore, ex jogador de futebol profissional que se aposenta depois de um acidente durante um jogo que acabou com a carreira de um dos membros do time adversário e passa a ser financial manager de atletas dessa indústria, junto com seu parceiro, Joe Krutel, ambos funcionários da Anderson Financial, comandada pelo linha dura Brett Anderson. O programa vai mostrar o dia a dia de ambos lidando com as criaturas instáveis que são os atletas em ascensão do esporte número um dos EUA, entre eles Ricky Jarret e Vernon Littlefield.


Além deles temos também personagens como Charles Greane, ex jogador de sucesso que se aposentou mas pode estar planejando um retorno aos campos e Reggie, amigo pessoal de Vernon e rêmora que orbita ao redor dele o responsável pelas finanças do colega até a chegada de Spencer. Molecada jovem com fama e uma tonelada de dinheiro, obviamente acabam fazendo muita merda e os episódios mostram Spencer e Joe pulando de crise em crise. O tom é de comédia com pitadas de drama. O drama é realmente tocante e a comédia....sério, ri alto várias vezes durante a temporada. 
A série me lembra uma versão de luxo (ou seja, uma versão HBO) de shows como "House of Lies" ou "Black Monday", mas melhor (apesar de, ao contrário das duas acima citadas, ter a falha de não trazer Don Cheadle no elenco). Ainda é uma série claramente voltada pro público masculino, trazendo os vícios típicos de um produto desse tipo (carrões, muita balada maior que a vida, um monte de mina nua ou de traje curto) mas com uma boa cota de subversões desses clichês (as mulheres da série transcendem os clichês de serem apenas interesses sexuais ou antagonistas, como ocorre em alguns casos de programas do tipo). 


Ainda tem muito daquilo de fantasia masculina de riqueza e poder, mas tem alguns elementos dramáticos em que assuntos como saúde mental e toxicidade masculina são trazidas pros holofotes, quase como um mea culpa do programa, usando tais tropes enquanto os desconstrói de leve.
Gostei bastante, apesar de achar que o final da temporada termina um pouco feliz demais. 
Vou continuar vendo com certeza e falo mais conforme for avançando.
E caso alguém esteja se perguntando: sim, The Rock consegue convencer que aquela montanha de músculos é, de fato, alguém trabalhando de terno e gravata numa empresa do ramo financeiro. 
E isso não é pouca coisa. :-)

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