quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Conversando com o Starman #18

Senhoras, senhores, mais um dia, mais uma sexta chegando, mais uma semana na qual sobrevivemos (continuamos em quarentena aqui, mas como todo mundo sabe, tem muita gente tendo que se jogar nas ruas graças a irresponsabilidade dos "nossos" governantes.  Tem também a galera negacionista sem noção, mas pro inferno com eles). Seu oráculo über-pop já está aqui para oferecer alguma luz pelas próximas 24 horas e vamos direto ao ponto: a faixa do dia é FALL DOGS BOMBS THE MOON


Contexto: Primeira faixa do "Reality", vigésimo terceiro lançamento da discografia Bowieana, e aquele que, por muito tempo, foi visto como o álbum final do artista, até que, 10 anos depois, "The next day" viria pegar o mundo de surpresa. Os elementos eletrônicos, protagonistas nos seus trabalhos da década anterior, ainda estão presentes, mas cedem espaço ao rock . Segundo trabalho seu feito pós 9/11, o disco não esconde que é um fruto de seu tempo (a faixa comentada aqui hoje sendo um exemplo perfeito disso). O título, "Reality" vem quase como uma elegia, uma memória perdida num mundo pós-realidade, pós-filosofias, em que a maioria das crenças e certezas que tínhamos como sociedade ruíram junto com as torres do WTC. 

Sobre a música: Para uma canção que possui uma letra tão críptica, é curioso notar como seu sentido é tudo, menos sutil. Mais uma vez, o eu-lírico adotado por Bowie é o do déspota que, deitado em berço esplendido, reflete sobre o próprio poder. 

"Hope little girl 
Come blow me away 
I don't care much 
I win anyway 
Just a dog 
I'm God damn rich 
An exploding man 
When I talk in the night 
There's oil on my hands 
What a dog"

Não um déspota qualquer, mas um barão do petróleo, explorando garotinhas e vendo pessoas explodindo como rojões sem se importar muito. 

"Devil in a market place
Devil in your bleeding face"

É o período de George W Bush e Tony Blair no poder, o ano em que Saddam Hussein seria capturado e onde seria "encerrada" a guerra contra o Iraque. As aspas presentes já que, de fato, as consequências dela e seus efeitos podem ser vistos até hoje, no mundo pós-Trump. 

"These blackest of years
That have no sound
No shape, no depth
No underground
What a dog"

Nestes anos, tão pretos quanto o óleo que esses homens vendem e pelo qual países democráticos foram, são e serão transformados em cinzas, não existe forma. Mercurial e líquida, nossa realidade está em constante revisão, num perpétuo estado de "não-ser", de "pós-verdade", de "alt-truth". Mas os cães da guerra, continuam gordos e felizes. 

Como vai ser o seu dia: provavelmente, muito ruim. Ou você é alguém em isolamento, e vai continuar assim se puder e apenas se você tiver condições disso, ou vai ter que sair de casa para garantir comida na mesa. Em ambos os casos, pode agradecer ao fascista miliciano na cadeira presidencial. Lembre-se disso nas próximas eleições, e não apenas para o cargo maior da nação, mas em todos os demais, do senado, passando pelos deputados, dos prefeitos aos vereadores. Mas mais além, repense sua relação com a política como um todo. Votar certo é obviamente importante, mas não é tudo. Votar certo é política, nossa relação com o mundo é política, como e contra o que protestamos é política. 
Tudo na verdade é. Repensar a própria vida e se enxergar como um sujeito político é um processo que leva anos, mas se queremos derrubar a besta maior que sustenta todo esse Sistema, é o que precisa ser feito. Cada ato seu, da cultura que você consome, passando pela comida que você decide comer, de onde você vai comprar as coisas que precisa, que projetos você apoia ou deixa de apoiar, financeiramente ou não, tudo isso é política. Parece óbvio, mas é importante ter isso em mente e, uma vez, cientes disso, correr atrás de informação. De novo, citando novamente uma frase que já usei aqui: toda jornada de 1000 quilômetros começa com um passo. 
Tá, tudo lindo, mas deixemos abstrações de lado: dois bons lugares pra começar? Aqui e aqui. Não precisa agradecer. 

Frase do dia: "There's always a moron/Someone to hate/A corporate tie/A wig and a date". Porque o Sistema precisa de um inimigo constante, um bicho papão novo todo dia pra manter as pessoas assustadas. Antes, eram os terroristas. Agora, são os imigrantes e os "comunistas". Amanhã, vai ter outro e outro e outro. Enquanto isso, os cães da guerra dormem tranquilos. E tudo "segue bem". 

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