segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Conversando com o Starman #20

Bom dia, senhores.
Nova semana, nova entrada em sua seção oracular favorita deste weblog..
Hoje, temos um capítulo particularmente diferente dos demais, o que é maravilhosamente adequado, considerando o caráter disruptivo do disco de onde a faixa que iremos comentar vem. Vamos todos para Berlin, enquanto ouvimos a instrumental (eu disse) e gélida ART DECADE.



Contexto: Então, "Station to Station" era passado. O Duque havia vindo e deixado a vida de Bowie em estado de "terra arrasada" e ele precisava de um recomeço, um sopro de ar fresco. E principalmente, de distância da cena de drogas de Los Angeles. O cantor nunca escondeu seu amor pela Alemanha, desde sua visita inicial a Berlin em 1969. A decisão parecia óbvia e ele (e Iggy junto) foi para a capital germânica. 
Como consequência, não apenas da mudança geográfica mas também do desejo de distanciamento do próprio passado e de uma mente aberta as influências locais, Bowie se viu curioso com as características da música pop de vanguarda produzida na cidade: era a época de bandas como Tangerine Dream, Kraftwerk, Can e Neu!. Em comum entre todas, o minimalismo, as vezes em menores tons, dividindo palco com sons mais grandiloquentes, as vezes tomando o papel de protagonismo. 





Com a parceria com Brian Eno veio também o interesse por sons mais ambientes. A idéia era rejeitar a história de "storytelling", de narração, que é característica da música americana em gêneros como o folk e o blues e se aproximar da criação de "cenários" sonoros. De fato, o primeiro LP resultante desta nova página na vida do artista, "Low", seu 11º trabalho de estúdio (1977), era dividido em duas metades distintas: o lado A tinha composições em que o rock e o eletrônico coexistiam em músicas com letras, mais próximos do passado de Bowie. Já o lado B era de faixas instrumentais, o mais distantes o possível do que se esperaria de um trabalho de "música pop". 
Não surpreendendo ninguém, "Low" dividiu opiniões do público e crítica da época. David, por outro lado, encontrava uma nova "caixa de ferramentas" pra brincar e estava particularmente "confortável" nela. Tanto que seus próximos dois lançamentos teriam fortes semelhanças estilísticas com este disco, daí o hábito de se reunir os três trabalhos sob o epíteto de "a trilogia de Berlin". 

Sobre a música: Okay, faixa instrumental, não temos o norte das letras para comentar. Mas o título da canção, "Art Decaded" é, na verdade, um trocadilho com "art decayed" (arte decaída), um comentário de Bowie sobre o estado estéril da cena artística do lado ocidental de Berlin na época, isolada criativamente do resto do mundo. A faixa, de menos de 4 minutos, evoca sensações de estranheza, certa tensão e ao mesmo tempo, conforto. Bebendo das influências locais, a faixa é econômica em seus sons, com os sintetizadores criando um canvas de texturas sonoras ao mesmo tempo agradáveis e estranhas. O final, catártico, parece nos pegar pela mão, e nos levar para um lugar seguro. 

Como vai ser o seu dia: Toda mudança é difícil. Eu sei, vocês sabem. Aliás, todo mundo, em escala global, se não sabia disso, aprendeu do pior jeito possível, com esse ano provocando quebras de paradigma de escala global. Adaptação é sempre importante. Absorva o que você puder do melhor do seu novo contexto e se permita se transformar. Toda mudança traz elementos positivos e negativos e cabe a cada um de nós, filtrar o que funciona e o que não. Se tornar algo diferente mas sem abrir mão daquilo que, por sua vez, temos de mais fundamental em nós. Porque, se afinal, mudar é inevitável, equilíbrio também o é. 

Frase do dia: Qual parte de "faixa instrumental" você não entendeu? Mas okay, okay,  se você precisa de uma frase pra servir de norte, que tal: "Todo mundo quer mudar o mundo mas ninguém pensa em mudar a si mesmo". 

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