terça-feira, 23 de maio de 2023

Navegando pelo multiverso: "Earth X" - parte 02


Na edição anterior, Aaron Stack foi "presenteado" (ou amaldiçoado, dependendo da perspectiva) com....bom... "perspectiva" é a palavra. Perspectiva histórica. Cósmica. Os olhos de Uatu. 

No texto anterior eu não comentei a esse respeito, mas é preciso lembrar que eu leio essa série com a "visão" de alguém que recentemente leu Inferno#4 de Jonathan Hickman e.... A edição que, sem hipérboles, muda TUDO no universo Marvel. Neste últimos 60 anos de existência da editora, principalmente depois da celebrada passagem de Chris Claremont pelos títulos mutantes, a história da Terra 616 tem sido vista como um cabo de guerra entre duas espécies: humanos e mutantes. O que Inferno faz, é nos lembrar que existe mais uma raça correndo por fora, desconsidera, desprezada, mas que decidiu clamar por sua posição como potenciais senhores do futuro do mundo: as máquinas. 

Formas de inteligência artificial, como é o caso da pedra fundamental deste universo: James Hammond, o Tocha Humana original. Na cena em que Aaron vê o nascimento do andróide, há um fechar de ciclo.




O passado, presente e futuro daquele planeta, girando em torno de seus homens-máquina. Claro que, mesmo esta perspectiva é uma simplificação, já que desconsidera outros agentes importantes na luta por dominância nesse contexto: Inumanos, Atlantes, Deviantes, Eternos, a nação Vampira, além dos "imigrantes" vindos de outros planetas ou mesmo dimensões e que fizeram da Terra a sua morada. 

O olhar de Aaron então, deixa o passado e foca no presente diante dele. Os Inumanos retornando para seu mundo de origem.

Uma América quebrada, consumida pela apática e lenta morte decorrente do capitalismo tardio, simbolizada não apenas pela grotesca figura do líder eleito daquela nação, Norman Osborn, mas por seu campeão. O homem conhecido como Capitão América. 

O sentinela da Liberdade aparece em uma cena que representa sua luta perpétua, seu pathos, sua razão de existência: um homem sozinho, contra o pensamento-colméia do fascismo. Um fascismo que, como é típico dele, coisifica. Torna tudo que toca em um monstro sem forma, sem individualidade, sem agência e poder. Uma coisa que apenas existe, que entregou qualquer poder ativo pela comodidade de fazer parte um grupo. Sem vontade própria, sem emoções. Vivendo pela propagação das próprias crenças, como uma idéia-vírus. 



Depois de décadas e décadas de guerra contra o fascismo, de guerra contra homens malignos tentando subverter o mundo à suas crenças e, paradoxalmente, de guerra contra "guerras", mesmo Rogers se vê exausto, quase cedendo ao pensamento-colméia. 

Homem ou Super-homem? 

"Qual o propósito da guerra se a paz for uma impossibilidade?"



A América de Earth X é um país distante do sonho do Capitão América. E como tal, o personagem se mostra um fragmento de um passado morto. Um sonho que se assemelha a imagem que temos de nossa passagens oníricas noturnas quando já acordados: sombras, memórias de memórias que nunca existiram. Vislumbres. Pedaços de um caleidoscópio partido em mil pedaços. 


Steve Rogers é um homem demolido não apenas pela passagem do tempo, mas por ter se ancorado em um sonho de América que nunca existiu. América. A terra da liberdade e casa do 1%. 

Sob o olhar perturbado de Stack, descobrimos que o Duende Verde transformou o país em seu quintal pessoal onde, a partir do poder eleito, transformou o país em uma subsidária da Oscorp. Onde famintos vivem apenas para trabalhar e sobreviver das migalhas que a elite "misericordiosamente" lhes joga de tempos em tempos. (Ainda bem que é só ficção).


"Homens não são feitos de pedra ou aço, mas barro, moldado pelas mãos da experiência".

Não existe sonho que sobreviva diante da fria realidade. Mudar ou morrer. Se adaptar ou ser deixado para trás.

Rogers fez sua escolha e agora, paga por ela. E o mundo inteiro com ele. 

A fantasia segue. Vingadores robôs. Cores que se destacam diante de um contexto pétreo e vazio. 

Sombras, sonhos de um passado que homens velhos tentam manter preso em âmbar. Gigantes mortos.

"Desesperai, ó grandes, vendo as minhas obras".

Arte e roteiro se juntam maravilhosamente contando o paradoxalmente sereno e cacofônico lento morrer daquele mundo. 

"an end..."

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