segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Cinco motivos pelos quais eu gosto mais do filme de V de vingança do que das HQs.


Ok, senhores, vejam o título desta matéria.

Ele diz "5 MOTIVOS PELOS QUAIS O FILME DE V DE VINGANÇA É MELHOR QUE A HQ"? Diz? Não, certo? ótimo, então encerramos aqui qualquer possível discussão sobre como adaptações sempre empobrecem a obra original, ou de como certas obras são feitas pra uma mídia específica e pensando exatamente nas características intransponíveis dessa mídia em questão, e etc. 

Eu sempre tento tomar cuidado com isso, inclusive fora do blog. Sempre pensar em termos de "minha obra ficcional preferida" e nunca "a melhor obra de todas" pq eu sei a diferença entre ambas. "A melhor de todas" demanda a avaliação de diversos aspectos técnicos e um conhecimento da obra e da história pregressa dela que seja, pelo menos razoável. Eu nunca diria "este é o melhor filme de terror de todos" sem considerar atuação, roteiro, todos os filmes que eu vi que são anteriores a este e etc. Agora, quando partimos pra área do "meu preferido" aí, desculpem a sinceridade, mas toca-se o foda-se. Vc poderia dizer que "Howard, o super pato" é a porra do seu filme favorito e eu não teria como argumentar (teria, claro, como questionar sua sanidade, mas faria isso apenas de forma mental, eu juro).
Se seu disco do coração é algo do Bon Jovi, de boa, guri. Só não vem me dizer que é o melhor do mundo.

Isso posto, eu tenho plena consciência de que existem, como já dito acima, diferenças entre filme e HQ e mesmo na lista abaixo, eu questiono a validade de um ou outro argumento meu. É plenamente possível que a HQ seja milhares de vezes melhor que o filme, até por ser uma obra cujo conteúdo dificilmente poderia ser concentrado em duas horas de filme. Mas aí entra a parte subjetiva que se deu em meu contato com ambas as versões. 

Feito esse gigantesco disclaimer, podemos seguir adiante. Então, hoje é 5 de novembro e, diabos, como eu adoro defender uma boa causa perdida, resolvi aproveitar pra tentar expor uma.... sei lá.... não vou chamar de birra contra a hq de V de Vingança pq não quero entrar num debate dialético comigo mesmo, mas é mais ou menos isso. Eu vejo todo mundo sempre falando do filme como "é claro que não é tão bom quanto os quadrinhos" mas em um ou outro momento eu me questiono: "não é MESMO?"
Antes, vem aquela parte da contextualização: Pra quem não sabe, "V for Vendetta" é uma Graphic Novel escrita pelo genial Alan Moore e desenhada por David Lloyd. Conta a saga de V, um homem (ou super-homem?) lutando contra um estado totalitário e arregimentando a jovem Evey Hammond, que pode se tornar sua sucessora nessa cruzada de justiça e (principalmente, e esse é um ponto que as pessoas frequentemente tendem a esquecer, mesmo considerando o nome do filme/quadrinho) vingança. Resumindo MUITO, é isso.


Eis aqui 5 razões pelas quais eu questiono essa suposta inferioridade da adaptação sobre o original e, pra ser justo, uma razão extra de pq eu gosto pra caralho da HQ, independente de qualquer coisa: 

5 - Os desenhos: Ok, aqui a coisa é absolutamente subjetiva, mas eu nunca simpatizei muito com a arte da série. Não que ela seja feia (e o que seria arte feia, de qualquer maneira?) de forma nenhuma, e nem é o caso de não gostar dos desenhos de David Lloyd, a questão é mais simples: eu tive uma certa dificuldade, da primeira vez que li a série, de diferenciar um personagem e outro. Sim, poderiam dizer que se eu leio hqs de super heróis, esse é um drama constante, e eu concordo (ou mangás, dependendo do desenhista, onde só o corte/a cor do cabelo e as roupas distinguem entre um sujeito e outro), mas ainda assim, é algo que me incomodou. Admito que esse é um argumento questionável pq como essa dificuldade de diferenciar ocorreu principalmente entre os membros do partido, o inimigo contra o qual V se levanta, poderiam alegar que essa semelhança entre os indivíduos seria proposital, de forma a salientar como o fascismo uniformiza, distinguindo quaisquer semelhanças, aquela idéia de "pensamento colméia" onde o indivíduo é descaracterizado em prol do coletivo e tals. Ok, excelente argumento, mas foi uma escolha estética que não funcionou muito bem comigo. Obviamente, esse foi um problema inexistente no filme, já que os atores são todos distintos entre si.

4 - O partido: Outra escolha complicada que não funcionou como deveria comigo. Eu entendo que era importante mostrar como funcionavam as engrenagens do partido, a luta interna por poder, na figura de Helen e Conrad Heyer e de toda sua preparação pra ocupar o lugar mais alto no poder. Mas de novo, acabou não funcionando comigo pq, sério, se vc já leu/viu qualquer, veja bem, QUALQUER obra distópica do tipo, vc já sabe mais ou menos como é a dinâmica interna desse tipo de organização, portanto, essa sub-trama acabava roubando atenção daquela que eu queria ver, que era a história do V e, paralelamente, a da Evey. 

3 - Os momentos mais trash: Sério, o que é aquele general ficando catatônico pq o V derreteu a coleção de bonecas dele? e claro, a morte do Gordon, mas eu retomo isso depois.

2 - O final: Aqui não é bem uma bronca. Vejam bem, eu gosto bastante do final da HQ, mas em termos de mensagem política, eu gosto bem mais da do filme. Nas Hqs, Evey termina usando o uniforme do V e continuando com a luta. A tocha foi passada, da mesma forma que no filme, ainda que de um jeito mais pé no chão. E é aí que eu fico balançando, pq, diabos, se é pra abraçar um fio de esperança, vá lá, utópico (não é bem o termo que eu queria aqui, mas fica) de mudança real e permanente diante de um contexto de opressão social, eu prefiro a mensagem mais rasgadamente utópica do final do filme, seja ela entendida de forma literal ou metafórica. Enquanto nos quadrinhos Evey luta pra que cada indíviduo se torne o V, no filme, efetivamente as pessoas se tornam o anti-herói. As pessoas insatisfeitas, os oprimidos, o 1% :-). E além destes, todos aqueles que morreram em prol da desintegração deste estado de coisas corrupto (personificados na presença dos personagens que morreram como Gordon, a garotinha de óculos e a atriz, vizinha de cela de V). Vítimas, mas também catalisadores destas mudanças.

E aí chegamos naquilo que sempre me incomodou na Graphic Novel e que eu prefiro muito mais na versão do filme: 



A real protagonista da história

1 - Evey Hammond: Sério, que me perdoem os fãs, mas a Evey dos quadrinhos é uma constante vítima das circunstancias. A mudança dela nunca me convenceu muito pq, pra começo de conversa, os acontecimentos que a causaram sempre me pareceram meio convenientes demais. Uma hora ela é uma vítima oprimida nas ruas, daí passa a ser cumplice do V. Aí ela foge e vai conviver com o Gordon que é morto de um jeito completamente aleatório (ele é assassinado por Aliston Harper, um chefe do crime local. E me perdoem os fãs - novamente - mas este é definitivamente um personagem de que não gosto, me parecendo fora de lugar o tempo todo), e mais uma vez, a pobre garotinha fica solta no mundo. Desculpem novamente, mas ela parece vítima de uma série de eventos que convenientemente se aliam de forma a mostra-la como uma pobre moça que, tal qual uma bola de pinball, bate e rebate em todos os lados até cair de vez na mão do V. A do filme não. Ela já é uma ativista política quando a história começou. É tb, insegura, mas num nível que soa perfeitamente crível (afinal, quantos ativistas políticos estão dispostos a cruzar a linha que separa o ativismo seguro da sempre perigosa desobediência civíl, e quantos destes dispostos não vão titubear antes?). E todas as mudanças sofridas são consequência direta da mão absolutamente visível do estado, oprimindo e caçando os próximos a ela. Nesse ponto, a relação dela com Gordon, completamente diferente da versão em quadrinhos, não é um momento solto, mas mais um elemento que constrói a visão de mundo da personagem que vai culminar no tipo de transformação capaz de tornar a menina forte, mas ainda assim frágil do começo do filme, para aquela que vai se tornar o projeto final do V. Aquela que deve ser o avatar de um novo mundo, não mais regido pelo medo, pela violência e pela opressão, mas por um conjunto de novos valores. O velho mundo morre com o V. A partir dali, o mundo vai se reerguer sob o cuidado de pessoas como Evey. Essa sim foi uma progressão de acontecimentos perfeitamente crível pra mim (ajuda também Natalie Portman, Hugo Weaving e Stephen Fry botarem pra foder no filme. Palmas pra quem selecionou esse cast pq não tem nenhuma peça ali fora de lugar - mesmo John Hurt, que alguns dizem estar meio exagerado no papel me pareceu correto ali, personificando a figura do "Grande irmão").


dito tudo isso, tem um momento que tem nas hqs e não na adaptação que eu senti muita falta que é, seguramente, um dos meus 10 momentos favoritos em qualquer hq: 


[V is talking to the statue of Madame Justice atop the Old Bailey]

V: Hello, dear lady. A lovely evening, is it not? Forgive me for intruding, perhaps you were intending to take a stroll, perhaps you were merely enjoying the view. No matter, I thought that it was time we had a little chat, you and I. Ahh... I was forgetting that we are not properly introduced. I do not have a name. You can call me V. Madame Justice, this is V. V, this is Madame Justice. Hello, Madame Justice.

V: [as Madame Justice] Good evening, V.

V: There, now we know each other. Actually, I've been a fan of yours for quite some time. Oh, I know what you're thinking... "The poor boy has a crush on me... an adolescent infatuation". I beg your pardon, Madame. It isn't like that at all. I've long admired you... Albeit only from a distance. I used to stare at you from the streets below when I was a child. I'd say to my father "Who is that lady?" And he'd say "That's Madam Justice". And I'd say "Isn't she pretty?". Please don't think it was merely physical, I know you're not that sort of girl. No, I loved you as a person, as an ideal. That was a long time ago, I'm afraid there's someone else now...

"Madame Justice": What? V! For shame! You have betrayed me for some harlot, some vain and pouting hussy with painted lips and a knowing smile!

V: I, Madame? I beg to differ! It was your infidelity that drove me to her arms! Ah-ha! That surprised you, didn't it! You thought I didn't know about your little fling, but I do! I know everything! Frankly, I wasn't surprised when I found out. You always did have an eye for a man in uniform.

"Madame Justice": Uniform? Why, I'm sure I don't know what you're talking about. It was always you, V. You were the only one...

V: Liar! Slut! Whore! Deny that you let him have his way with you, him with his armbands and jackboots! Well? Cat got your tongue? I thought as much. Very well. So you stand revealed at last, you are no longer my Justice. You are his Justice now, you have bedded another. Well, two can play at that game!

"Madame Justice": Sob! Choke! Wh-Who is she, V? What is her name?

V: Her name is Anarchy. And she has taught me more as a Mistress than you ever did! She has taught me that Justice is meaningless without Freedom. She is honest, she makes no promises and breaks none. Unlike you, Jezebel. I used to wonder why you could never look me in the eye. Now I know. So goodbye, dear Lady. I would be saddened by our parting, even now, save that you are no longer the woman that I once loved. Here is a final gift. I leave it at your feet.

[V leaves a small heart-shaped chocolate box at the statue's feet. As V walks away, the box explodes, destroying the Old Bailey and the statue]

V: The flames of Freedom, how lovely, how just. Ahh, my precious Anarchy... "O beauty, 'til now I never knew thee".

Épico, pra dizer o mínimo. De resto, ambos, filme e HQs, são fantásticos, com seus méritos e falhas individuais. 

Ao preferirem fazer uma adaptação menos presa aos quadrinhos (inclusive, no poster do filme constava a frase - "livremente adaptado dos quadrinhos de Alan Moore"), os Wachowski acertaram a mão, criando um filme de profunda relevância política (taí o pessoal do Anonymous e do movimento Occupy que não me deixam mentir). Dessa forma, funciona em seu incisivo ataque aos governos, ao poder totalitário e repressor das liberdades individuais e ao papel da mídia e da religião como mantenedor desse status quo. Mas, não nos esqueçamos, também funciona como entretenimento (afinal, é um puta filme de ação), contando a história fascinante de um mundo em mudanças e dos personagens geradores dessas mudanças, V e Evey. 





Então, é isso, senhores. Curtam o 5 de novembro, e não se esqueçam do que a data significa.

Curtam a Anarquia, crianças. ^^

FIGHT THE POWER!!!! o/

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