sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Doctor Who 9x08 - "The Zygon Inversion": Break the cycle!!...


Well...... temos aqui um novo clássico. 

Simples assim. Após ver o episódio pela primeira vez, eu imediatamente tuitei que tinha encontrado um novo episódio favorito da série inteira. Passados alguns dias e após uma segunda assistida, reafirmo o que disse antes. Estamos diante de um episódio absolutamente antológico (e só pra constar, o episódio que ocupava essa posição anteriormente na minha listinha pessoal era.... "Listen"). Curiosamente "Listen" e "The zygon inversion" são dois episódios bem diferentes mas que se assemelham em seus méritos: extremamente bem escritos, atuação soberba (e aliás, o episódio só atinge esse nível de excelência exatamente por causa do seu elenco), uma história que encapsula em um episódio tudo que faz Doctor Who ser minha série favorita, um equilíbrio perfeito entre drama e ação. E ainda por cima, politicamente relevante.



Se o episódio passado versava sobre o ISIS, esse aqui abre o escopo e fala sobre absolutamente todas as guerras e revoluções armadas já ocorridas na história da humanidade (e do universo...). Alguém mais chato poderia dizer que a série soa ligeiramente hipócrita quando bota o Doctor, o rebelde anarquista mercurial arquetípico que costuma derrubar governos tirânicos antes do café da manhã, falando contra revoluções mas eu considero tal ponto extremamente equivocado e ingenuo já que o que o Timelord faz, frequentemente, é impedir que o curso da história de povos e civilizações seja alterado pela inserção forçada de raças alienigenas. E, claro, o Doutor não usa armas ou segue uma ideologia estabelecida. 
Obviamente o protagonista tb não é contrário a idéia de sacrifícios mas a crítica aqui vai aos meios e fins. Vale a pena sacrificar dezenas, milhares, milhões, BILHÕES de vidas por uma causa onde o resultado final é apenas a substituição de um modelo político por outro? Faz diferença matar pelo direito de ter alguém completamente novo esmagando o pescoço de uma sociedade com suas botas? 
A resposta aqui é um sonoro NÃO. Um futuro diferente pode e DEVE ser almejado mas guerra nunca é um meio aceitável de alcança-lo.


Eu já disse aqui o quanto eu absolutamente adoro a trilogia Matrix, certo? os 3 filmes. Sim, sim, eu amo "Matrix Reloaded/Revolutions". Eu frequentemente vejo gente dizendo que o final do filme soa fraco e que no final a humanidade deveria vencer as maquinas e tals. No entanto, se me permitirem discordar, eu diria que é EXATAMENTE a negação a tal paradigma que faz os dois filmes finais da trilogia me soarem tão mágicos: Neo consegue enxergar além da dualidade e da falsa visão de alteridade. Tal qual como em "The Invisibles" de Grant Morrison, só existe uma ilusão de dualidade. Na verdade, o que vemos são diferentes dedos de uma mesma gigantesca mão cósmica tentando se matar. A anulação de um dos dois lados provavelmente só resultará na obliteração de ambos.



É o que o Doctor consegue enxergar aqui: uma longa corrente de violência em que um lado derruba quem o oprime apenas para oprimir um próximo grupo, que depois de alguns séculos, consegue derrubar seu opressor para começar a se tornar igual a ele e ser posteriormente derrubado. Qualquer um com mais de meio neurônio, que já tenha passado da adolescência e tenha tido acesso à um livro de história sabe que toda revolução popular em toda história da humanidade pregava valores utópicos. O que vinha, inevitavelmente, após a vitória desses grupos, era a tal estrada para a felicidade pavimentada com o sangue e corpos de inimigos - e aliados.



E não citei aqui a adolescência à toa: percebam como o tom de Bonnie, a líder dos Zygons rebeldes, soa até ligeiramente ingenuo no seu discurso pós moderno: o objetivo principal é a guerra, a retomada armada de seus "direitos inatos" visando.............. o que?  A mesma falha estrutural que fez o movimento Occupy miar depois de algum tempo: histeria sem objetivos práticos. Derrubar um sistema apodrecido é uma idéia bem legal mas é preciso ter em mente que após a festa da vitória terminar, após o estilingue virar vidraça, algo precisa ser construído no lugar. O que o Doctor propõe é: pq não pular a fase das balas voando e ir direto pra parte da reconstrução? O modelo resultante não vai ser o ideal pra nenhum dos dois lados mas pelo menos pode se chegar à um denominador comum. Não vale a pena o risco?



O primeiro passo aí é, e eu vou bater nessa tecla toda vez que ela se mostrar presente na série, a narrativa.
Sim, sim, o tema dessa temporada se mostra mais uma vez: Zygons são alienígenas que usam memórias, histórias, narrativas contra seus inimigos, mas não é a esse tipo de narrativa que me refiro.
Posso estar mexendo num vespeiro sem tamanho aqui, mas aqui vou eu: TODO movimento revolucionário se sustenta em cima de bases fantasiosas. Primeiro, a da alteridade. Nós X eles. Segundo, a do "direito divino". Os revolucionários são heróis. Os inimigos, são monstros a serem vencidos. Nesse ponto, o que o Doctor faz me lembrou um pouco o final de "Collectors", uma das melhores edições de Sandman, criação de Neil Gaiman. Na edição 14, testemunhamos um grupo peculiar de pessoas indo se encontrar pra uma convenção de cerealistas..... well... mais ou menos. Descobrimos, conforme a história avança, se tratar, na verdade, da primeira convenção de assassinos seriais do mundo, onde diversos homicidas podem "trocar informações e vivencias". Ao final (e resumindo MUITO), Morpheus, o sr. dos sonhos - e protagonista da HQ - aparece e decide punir as pessoas ali. Sendo o sr. dos sonhos e das histórias, Morpheus os condena a se verem pela primeira vez como aquilo que são: assassinos. Matadores. Não heróis, não deuses, não mensageiros de deuses ou demônios, não caçadores, não criaturas poderosas. Apenas isso: pessoas que matam pessoas. Sem nenhuma capa, história ou ilusão de grandeza. O efeito, como os senhores podem imaginar, é devastador





O que o Doutor faz com Bonnie aqui é algo bem parecido. Se a líder da facção rebelde quisesse seguir adiante e apertar um dos botões da "Osgood box", ela poderia, mas ela não teria o direito de se enxergar como nada além do que ela era ali: alguém disposta a matar pessoas. Não alguém fazendo sacrifícios em nome de uma causa maior, não uma avatar de retidão. Só isso: uma assassina em massa.  Awesome, não? Como eu disse num dos textos anteriores: como vc derrota uma história ruim? Com uma história melhor.



Méritos pro roteiro de Peter Harness e Steven Moffat por lembrar que o caminho pacífico NÃO é fácil. Que me perdoe John Lennon mas is NOT easy if you try. Paz demanda esforço. Ordem é algo extremamente complexo num universo que tende ao caos.



O elenco aqui está espetacular. Mais uma vez, as falhas inerentes de Kate Lethbridge-Stewart saltam aos olhos, mesmo sendo uma personagem extremamente likable. Como alguém em posição de poder, seu primeiro comprometimento é com a segurança dos seus. Não é pra menos que ao final do episódio, o Doctor apaga a mente dela e não da Bonnie. Não nos esqueçamos que Kate é filha do homem que exterminou uma raça inteira de Silurians, mesmo depois deles terem se rendido. Adoro o Brigadier, mas, vamos admitir: in the end, soldiers will be soldiers.  Se Bonnie é a personificação da guerra, Osgood (Ingrid Oliver) é a personificação do mútuo acordo, da tentativa de conciliação. Fascinante ver como uma personagem que surgiu como alívio cômico virou algo tão maior. É aquilo do "exército pessoal" do Doutor. 


E falando nisso, Peter fucking Capaldi. Ow, boy.........O que foi aquele discurso? Capaldi agora ganhou seu monólogo a ser replicado pelos fãs e demais doutores, anteriores e posteriores, em convenções futuras, tal qual o do 11th diante de Stonehenge ou o do 1st ao se despedir de Susan. Qualquer vídeo dos melhores momentos da série vai ter que incluir cenas do Capaldi abrindo seu coração sobre como guerras são horríveis. Um ator menos talentoso teria tido dificuldades de mudar de tom naquela velocidade, alternando entre o "apresentador de talk show americano" para o homem que carbonizou Gallifrey (well....). Se o 9th sofria de stress pós traumático, o 10th era profundamente deprimido e o 11th era o homem que tentava esquecer a Timewar, o 12th é a regeneração que vai superar os demônios pessoais. A tabula rasa sobre a qual todos os futuros Doutores vão surgir, libertos dos horrores da guerra do tempo. 



E por fim, Jenna Coleman. WOW. Fucking WOW!!!! Seria preciso a atuação de uma vida pra se manter no mesmo nível de Peter Capaldi na cena clímax do episódio e a atriz não entregou nada menos que isso. 
Eu já disse que Clara Oswald já é, fácil, a minha companion favorita da série moderna mas vou ir além: Jenna Coleman é a melhor atriz da série pós retomada de 2005 (só sendo igualada pela megalovax foda Catherine Tate). E uma das melhores de toda a série. Bonnie e Clara eram tão absolutamente distintas e ainda assim, podíamos ver traços da Clara nos trejeitos da invasora (ou seja, Jenna atuando como uma alien com trejeitos que imitavam a companion. Camadas e tals). E que cena incrível a dela tentando retomar controle do próprio corpo enquanto "Zygella" tentava explodir o avião em que o protagonista estava.



Enfim, uma convergência de eventos absolutamente espetaculares compondo um episódio que jogou o nível de qualidade da temporada o mais alto possível. Se continuar assim, mesmo com um começo meio irregular, a season 09 vai se estabelecer como uma das mais fortes da série atual. Expectativas altas aqui.

Mais alguns pontos: 

- O híbrido. who cares? Eu ainda acho que isso vai ser um detalhe resolvido em dois diálogos, uma técnica de ilusionismo pra atrair nossa atenção enquanto a real mágica está sendo feita na outra mão. Ou não, sei lá, mas considerando o que já conhecemos de Steven Moffat.....



- Obviamente não posso esquecer de citar uma das cenas mais poderosas do episódio: a do Zygon forçado a abandonar seu disfarce e que, desprovido da habilidade de se transmorfar, termina se suicidando. Se o episódio de semana passada quase chega a simpatizar com a causa de Bonnie, esse aqui nos lembra que ideologias são "narrativas" (viram o que eu fiz aqui?) legais, mas elas só se sustentam quando comparadas com suas consequências. E no final, havia algo errado numa ideologia que usa como alicerce a dor de indivíduos como esse. 
- Mais alguém berrou com o "5 rounds rapid" da Kate? Pra quem não pegou....


- Clara fucking Oswald. Vou reforçar uma tecla que todo mundo já tá batendo: devagarzinho ela está se tornando o Doctor. A idéia sempre foi que a companion e não o Timelord fosse o nosso ponto de identificação na série e essa é a primeira vez, em todos os 50 anos de episódios já assistidos, que eu sinto vontade de ser o companion (ok, sendo justo, terceira vez, já que existiram Romana II e Jamie McCrimmon). Normalmente vemos o efeito do Doctor em seus companions mas dessa vez é ela que vai deixando as maiores marcas na personalidade do 12th. Lindo e tals mas......da ultima vez que uma companion virou o Doutor.... well.... vcs se recordam de como tudo terminou, certo? 


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