quinta-feira, 9 de junho de 2016

Sobre vitórias, derrotas e cotoveladas voadoras......



Pelos comentários que eu deixo aqui e ali, seja nos posts daqui do Groselha ou lá no twitter, vcs ja devem ter deduzido mas here we go: as seções fixas daqui do blog (incluindo as que eu iria começar e que já vão estrear atrasadas) todas sofreram um pequeno atraso pq.....bom, pq eu estou completa, total e absolutamente viciado nos documentários lançados pela WWE. 
Sem brincadeira, já foram uns 5, fora especiais com compilações de lutas clássicas. E parece pouco, certo?
Mas cada documentário vem em boxes de 3 dvds: o documentário propriamente dito, e nenhum dos que já vi tinha menos de duas horas, e os outros dois só com lutas clássicas do biografado em questão, na íntegra (e aí vcs podem jogar umas 4 horas de combates em cada disco)
A sensação é a parecida de quando vi a série clássica de Doctor Who quase inteira: o começo é meio claustrofóbico, já que vc se vê sobrecarregado por décadas e décadas de mitologia já estabelecida.
Mas aí vc vai consumindo esse lore, pegando as piadas internas, os momentos clássicos, as mudanças de paradigmas e as viradas de "trama" que provavelmente surpreenderam até os próprios autores (\o/ YES! YES! YES! YES! YES! YES! YES! YES! \o/). Sim, a coisa tem suas sub divisões que complicam um tiquinho o trajeto (eu ainda não sei se eu entendi direito as diferenças entre Raw, Smackdown, Fastlane e Payback) mas nada que torne a empreitada impossível.



E uma vez lá dentro, a coisa é simplesmente mágica. Sim, eu sei, little John, vc está agora se achando no píncaro da própria esperteza enquanto grita "é tudo de mentira, não é de verdade, não é um esporte de verdade, vai ver MMA pra ver a real thing". 
Desconstruindo esse argumento: sim, as lutas são encenadas. Mas aqueles homens lá são personagens e pros personagens, that's real and that's enough for me. Sabe quando Luke Skywalker lutou contra Vader em "Empire.." ou Neo contra o Agente Smith em "Reloaded" e vc ficou tremendo de ansiedade e excitação? Adivinhe: TB ERA ENCENADO. Isso impediu vc de se conectar emocionalmente com o que estava vendo? Não? Pois é. 
Nesse aspecto, eu aproximo muito a luta livre profissional com tokusatsus e quadrinhos: em todos os exemplos citados, a obra em si é só parte do processo. O raciocínio participativo de quem está acompanhando é a metade que falta pra mágica acontecer. É o leitor quem vê duas cenas de combate numa página de hq e confere movimento à elas, na própria cabeça.



É o espectador que vê os planos mirabolantes do império invasor nas séries de tokusatsu e abraça aquilo de tal forma que manda qualquer suspensão de descrença pra casa do cacete.
E é a minha cabeça que vê, por exemplo, Stone Cold Steve Austin cochichando algo no ouvido de Big Show e ignora que é uma instrução a respeito do próximo movimento a ser executado, preferindo pensar que o lutador balbuciou alguma bravata antes de golpear o adversário. E uma vez completado esse processo de suspensão de descrença, BOOM. Vc é transportado pra um universo onde o destino de vidas gira em torno dos eventos dentro daquele "squared circle". Aqueles não são apenas atletas ou performers, mas gladiadores envolvidos em feuds calcados em conceitos como honra, traição, lealdade, arrogância e semelhantes. E no meio do processo, cotoveladas voadoras e acrobacias potencialmente fatais....



Então...... os documentários já vistos. Não vou resenhar um por um pq ou dar estrelinhas pq, c'mon. Não são 5 histórias de vida separadas, mas 5 perspectivas que compõem uma rede muito maior e com constantes crossovers entre seus personagens principais. E, não sei se esse foi o critério de escolha que definiu quais seriam os primeiros biografados, mas é fascinante notar como são figuras completamente distintas umas das outras.



Triple H é a história do self made man. O gigante vilanesco aparentemente bronco mas que se tornou um dos maiores homens de negócios da WWE e a mente que transformou a NXT no que é atualmente. 



Mick Foley é a ovelha negra. Já falei dele aqui antes e provavelmente, Foley é meu lutador favorito. Num mundo de gigantes, ele se destaca pela violência extremada. Lutas contra ele em suas diferentes personas (Cactus Jack, Dude Love ou Mankind) invariavelmente envolvem uma meia suja. E tachinhas. E um taco de baseball com arame farpado. Ocasionalmente, combustíveis inflamáveis. E sangue. Pra caralho. Considerando isso, foi surpreendente ver que o redneck psicótico que parece um dos caipiras saídos direto de "Deliverance" é, fora dos ringues, um homem extremamente articulado e com uma mente afiada e um senso de humor único. 


Shawn Michaels é o ultimate entertainer. Junto com Triple H, um dos lutadores mais importantes da história da pro-wrestling, sozinho ou como parte do DX (junto com a finada Chyna).



Stone Cold Steve Austin* é o working class hero, o Springsteen do negócio. Quando "the rattlesnake" sobe no palco, podem ter certeza, o que virá é um espetáculo que vai ficar na memória. 3:16. Stunners. Um gigantesco dedo do meio na cara do establishment (literalmente, inclusive, como o próprio Vince McMahon pode atestar)



Ric Flair é uma das pedras fundamentais do negócio, estando pra atual configuração da luta livre profissional como o Superman pré crise estava pro universo DC pós Crise nas Infinitas Terras. História viva e ainda atuante (como treinador) do esporte. E responsável por me levar ás lagrimas duas vezes. Uma, na cena emblemática que termina sua luta com Shawn Michaels, que por sua vez, vai ser sua derradeira aparição como lutador. E a segunda vez, quando ao final do doc., ele manda, às lágrimas, um sonoro "I don't wanna go". Jesus amado...the feels.

E falando de lágrimas, falemos do tal "plot twist imprevisto por todos os envolvidos" que comentei lá em cima e o protagonista do ultimo doc que vi: Falemos de Daniel Bryan.



Um dos elementos fascinantes de ver tais documentários é a sensação de ver toda uma vida e uma carreira resumidas em duas horas. Começo, meio e, as vezes, no caso dos que já se aposentaram, fim. 
Na maioria dos caso, décadas e décadas de vida passando na tela em mais ou menos 120 minutos.
O estranho de Daniel Bryan é como ele epitomiza tudo isso num período injustamente menor de tempo. Uma década e meia. Desde seu surgimento quando atuava como um "enmascarado" até sua rápida passagem por ligas "menores" e sua estréia na liga principal. Vejam bem: olhem pra essa figura.



Num negócio que envolve gigantes como Triple H, Undertaker, Big Show, Kane e outros, ou mesmo massas de músculos como John Cena ou Chris Jericho, temos Daniel Bryan.
Não muito grande. Não muito musculoso. E com um visual tão mundano que parece que vamos dar de topa com o rapaz comprando pão na esquina quando formos à padaria mais próxima. 

and then.........


Magica. O Underdog vai devagarzinho galgando posições e deixando a carcaça de gigantes pelo caminho. E os storytellers da WWE, percebendo a pérola que tem em mãos, botam todas as fichas na mesa num episódio que só pode ser descrito como "épico", apresentado na 30ª edição do principal evento anual da empresa, o Wrestlemania. Não um, não dois mas TRÊS fucking monstros deixados pra trás.....e a consagração. 


Vejam bem: eu nunca, não importa quantas horas eu passe na academia perto de casa, eu jamais vou ser um monstro gigantesco como Triple H, Batista, Kane ou Taker. Mas hey......  Daniel era um de nós. Esse elemento relacionável tornou a conexão com o público inevitável e o resto é história. 
E aí....vieram os problemas médicos, as concussões e os ataques convulsivos resultantes colocando um ponto final na história do rapaz. E veio o adeus.


A vida de Daniel Bryan sumariza com perfeição pq luta livre é uma parada tão única e mágica pros fãs. Pela história de superação, pelo campeonato impossível, pelo final melancólico mas grato. Pelos homens e superhomens e mulheres e supermulheres que protagonizam tais sagas de vitorias pessoais, derrotas que quebrariam qualquer espírito mais fraco e os subsequentes momentos de superação catárticos (duvido que não tenha um fã que, por mais improvável que seja, não tenha um fiozinho de esperança de ver Daniel voltando pra luta livre, mesmo que não seja como lutador). Pelas longas epopéias de altos e baixos, viradas imprevisíveis e conclusões arrebatadoras. 
E claro, pelas cotoveladas atômicas e cadeiradas nas costas ligando um ponto e outro na história.


* pra quem já for fã de luta livre e quiser conhecer umas histórias de bastidores muito legais, corram pra baixar o podcast de Steve Austin, atualmente um dos meus preferidos (e eu tenho uma lista que já ultrapassa a casa da centena de programas cujo feed eu assino via app no celular então, falo com propriedade). Comecei a ouvir esses dias mas já indico os episódios em que "the thoughest s.o.b. of this business" entrevista Mick Foley, Big Show e a dupla Enzo e Big Cass. 


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